• Oficina De Olho na CFEM. 31/01/25. Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/ ATBr.

“De Olho na CFEM”: oficina aborda distribuição desigual de royalties da mineração

Enquanto a mineração avança e ameaça territórios, comunidades e modos de vida em todo o Brasil, movimentos populares e organizações da sociedade civil têm discutido os impactos da distribuição desigual dos royalties da mineração nos municípios brasileiros. Foi nesse contexto que, em janeiro deste ano, o Núcleo Amigas da Terra Brasil (NAT/Brasil) e o Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) promoveram a oficina "De Olho na CFEM". O encontro reuniu lideranças comunitárias, pesquisadores e militantes para discutir a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM) e buscar caminhos para superar a dependência econômica da atividade minerária.

Oficina De Olho na CFEM - 31/01/25 - Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/ ATBr
Oficina De Olho na CFEM. 31/01/25. Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/ ATBr.

O que é a CFEM e como funciona a arrecadação?

A Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM) é uma taxa que as empresas mineradoras pagam ao Estado brasileiro para explorar os recursos minerais. Conhecida como o "royalty da mineração", a CFEM foi instituída pela Constituição Federal de 1988. O texto estabelece que esses recursos são propriedade da União e permite a sua exploração somente mediante compensação financeira.

Os valores arrecadados pela CFEM são distribuídos entre estados, Distrito Federal, municípios e órgãos da administração federal. Esse pagamento é obrigatório e tem como objetivo compensar o uso dos bens minerais da União e, idealmente, promover a diversificação econômica no país.

Segundo a Agência Nacional de Mineração, a arrecadação da CFEM é distribuída da seguinte forma:

  • 7% para a agência reguladora da mineração;
  • 1% para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT);
  • 1,8% para o Centro de Tecnologia Mineral (CETEM);
  • 0,2% para o Ibama;
  • 15% para os estados e o Distrito Federal onde ocorre a produção;
  • 60% para os municípios e o Distrito Federal produtores;
  • 15% para municípios e o Distrito Federal afetados pela atividade mineradora, mesmo que a produção não ocorra em seus territórios.

No entanto, apesar de gerar bilhões em arrecadação anualmente, o retorno da CFEM à sociedade vem sendo questionado pelas comunidades afetadas pela mineração. Elas apontam como problemas o baixo valor da alíquota e as altíssimas taxas de sonegação por parte do setor.

De acordo com o Instituto de Estudos Socioeconômicos, outro problema é que o setor é dominado por corporações que operam no Brasil, mas são transnacionais. Sendo assim, elas extraem vastas quantidades de recursos do país, mas o dinheiro circula mesmo é no mercado internacional. 

No modelo atual, a mineração gera impactos devastadores aos povos e territórios. Os efeitos incluem o aumento da violência, feminicídio, prostituição infantil, poluição, contaminação, devastação da natureza e o adoecimento físico e mental da população. Nesse sentido, organizações da sociedade civil e movimentos sociais têm se articulado em diversas regiões do país para debater a CFEM, a partir de três pontos principais: transparência, controle social e o uso dos recursos para garantir direitos.

A transparência envolve questionar como as prefeituras divulgam as informações sobre os valores recebidos e como esses recursos são utilizados. Já o controle social diz respeito à criação de mecanismos que permitam à população e aos grupos organizados fiscalizar e influenciar as decisões sobre o destino da CFEM. Por fim, o uso da CFEM para garantir direitos busca fortalecer a atuação de coletivos e movimentos para exigir que esses recursos sejam investidos em políticas públicas que promovam justiça social, reparação aos territórios impactados e desenvolvimento local sustentável.

A oficina "De Olho na CFEM" reuniu lideranças comunitárias, militantes, pesquisadores e pessoas afetadas pela mineração para debater o destino desses recursos, os desafios da gestão pública local e a importância da participação popular nos processos decisórios. Na ocasião, ficou evidente a percepção coletiva de que os recursos da CFEM deveriam ser direcionados para garantir direitos básicos como saúde, educação, saneamento e para diversificar outras formas de vida, para além da força centrífuga mineral. No entanto, foi apontado que, na prática, a distribuição dessas verbas costuma beneficiar elites locais e ignora a participação efetiva das populações afetadas.

O encontro também teve um caráter propositivo. Foram debatidas estratégias para construir novos horizontes de transição energética a partir do controle social sobre os recursos minerais, com foco em garantir os direitos das populações afetadas, exigir transparência nas decisões e pressionar pela justa aplicação dos ativos oriundos da CFEM. A superação da minerodependência foi apontada como um dos grandes desafios para alcançar um modelo de desenvolvimento justo, sustentável e autônomo.

A oficina "De Olho na CFEM" integra uma série de ações desenvolvidas pelo Núcleo Amigas da Terra e pelo Movimento dos Atingidos pela Mineração (MAM), que denunciam os impactos da mineração nos territórios e propõem alternativas construídas a partir do protagonismo dos povos afetados. A disputa em torno dos royalties da mineração é mais do que uma questão técnica ou orçamentária, trata-se de um tema central na luta por justiça ambiental e soberania popular.